sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Carta de amor ridícula para um moço bonito

 Querido moço bonito de olhos bonitos,

Acabo de consultar a luz da lua: lua, tu que estás neste instante a brilhar sobre os telhados da casa onde mora o moço bonito de olhos bonitos, sabe me dizer se ele pensa em mim?

A lua nada me respondeu, talvez porque te encontrou dormindo, a sonhar sonhos onde não estou, onde nem faço parte...

Ah! Se os olhos do moço bonito se encontrassem com os meus, os meus olhos que erram perdidos, vagando neste mar de tristeza e abandono ganhariam nova luz...

A lua, indiferente às minhas penas se ocultou na espessa nuvem, tão indiferente quanto o indiferente olhar do moço bonito de olhos bonitos, cujo sonho não toca o meu.

Então aqui me despeço, com um doce beijo que encomendo à brisa que perpassa os meus cabelos, cabelos que um dia pentearei com vagar para o moço do meu sonho. Brisa, leve minha saudade ao moço bonito de olhos bonitos, e diga pra ele assim bem baixinho sussurrando num psiu: moço! eu te amo por nós dois. De repente você nem precisa me amar.





Geeeeeeeente não é que saiu a carta de amor ridícula...

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Refaço mentalmente o desenho do seu rosto

Refaço mentalmente o desenho do seu rosto
como se estivesse para morrer
e essa fosse minha última missão

Percorro diariamente um a um seus pensamentos
e converso com eles como se também fossem meus

Já conheço todas as suas chaves?

Ah, não é essa, não é essa, ainda não é essa...

Mas seguirei forçando fechaduras de cofres perdidos

Um dia essa porta abrirá
Ou outra
Ou o livro
Ou a outra vida que ainda tenho para viver aqui


 

domingo, 26 de outubro de 2008

Forno em manutenção

 UM DIA FAREI UM POEMA

“Imoral é o poeta que escreve ruim, este é pornográfico até dormindo”
José Alcides Pinto


Um dia farei um poema
não à Solano Trindade.
Mas um poema, louco, despudorado,
sem meias palavras, sem “cortes”,
sem nada de hermetismo,
sem nenhuma filosofia,
sem nenhuma frescurite,
sem nenhuma explicação.
Que seja entendido
por quem quer que dele se aproxime

II

Quero um poema propositadamente
diferente daquilo feito
pelos poetastros sabichões
- esses que escrevem duas linhas
em forma de poesia:
desconexas, insossas, inodoras, incolores
e sonham com o Prêmio Nobel
no próximo verão.

III

Chega de surrealismo tupiniquim.
Nada mais chato e imoral
do que ver um bando de idiotas
diante de uma página quase branca,
discutindo o “nada”, o “abstrato” dos “abstratos”,
todos com ares de sábios de Grécia antiga
em torno de frases abestalhadas,
quase sem nenhum sentido.

IV

Como o velho Bandeira,
estou farto de poetastros
cheios de pretensões e mesmices;
chega dos borges periféricos,
dos pounds, dos paz, dos maiakovski,
dos eliots, dos aragons, dos bretons, dos guilléns
mal lidos, mal digeridos
e vomitados a todo vapor
por todos os pedantes inovadores,
que lêem seus preferidos
muitas vezes no original
- em especial os castelhanos,
os quais não entendem
(muito menos se fazem entender)
vamos fazer poemas sobre nossa realidade:
poemas simples, terra-a-terra,
à Ascenço Ferreira, à Manuel Bandeira,
à Cassiano Ricardo (Castro Alves continua vivo)
e deixemos a macaqueação de lado.

V

Por favor, deixem os elouard em paz,
deixem prévert em paz.
O cadáver de Breton quer apodrecer.
não maculem a memória de Fernando Pessoa
Sejam vocês mesmos, porém sem incomodar ninguém.
Drummond – só existiu um.
Por favor, deixem as carcaças
dos irmãos campos federem em paz
- já nasceram mortos. Bem mortos.
chega de concretismo, chega de formalismo, chega de
estruturalismo, chega de prosa,
chega de idiotismo. Ora, pois, pois!...
Estamos conversados

Aristides Theodoro
Toca Filosófica 26/7/2006

sábado, 25 de outubro de 2008

Com açúcar, com afeto

 Vovó Maria Luíza  era ruim que só a peste!

Essa frase está na boca de todos nós os seus descendentes. Vovó faleceu aos noventa e quatro anos, morreu de velhice, dormiu e não acordou mais. Morreu em santa paz.

Quanto à frase acima, não se assuste com ela. Vovó Maria Luiza saiu deste mundo aquecida pelo nosso amor e pelos nossos cuidados. Eu a amava muito, mas não modifico a frase:

Ela era ruim que só a peste.

Eu poderia contar muitas de suas ruindades, mas acho melhor contar que ela guardava em si um estranho paradoxo: na mesma facilidade com que amaldiçoava uma pessoa, a outras abençoava. E tanto suas bênçãos como suas maldições se cumpriam, e com rapidez espantosa. Eu já presenciei uma de suas maldições se cumprir em coisa de poucos meses. Para abreviar a história, direi que um certo sujeito que se atravessou no seu caminho morreu totalmente paralítico. E isso saiu de sua boca.

Então não vou perder tempo falando de suas ruindades, pularei essa parte e irei direto para sua parte boa: as bênçãos, as orações, até porque essas histórias as pessoas gostam mais de ouvir, principalmente os crentes. Vamos a história, e saiba que é apenas uma de uma série, tenho uma porção de histórias incríveis como essa para contar de minha avó:

Foi em Jaú, interior de São Paulo. Havia uma crise no fornecimento de açúcar, isso foi há muito tempo atrás. Essa história chegou a mim contada pelos parentes, eu não era nem projeto. Açúcar havia, mas os usineiros estavam estocando o produto para alcançar um preço melhor, ou deixando de produzir, não sei bem, porque o que sei é que açúcar estocado muito tempo vira pedra. Não entendo bem essa parte. O que sei é que minha avó e outras mulheres do povoado já estavam usando balas para adoçar o café das crianças.

Então vovó resolveu enfrentar o problema com sua especialidade número um: joelhos no chão. Aqui um parêntese: cresci ouvindo vovó falar de seus joelhos no chão, ela fazia a gente passar a mão nos seus joelhos, para constatar que ali existiam calos. Calos de oração! E o engraçado disso tudo é que ela tinha calos no joelho mesmo.

Então ela fez uma oração. Eu posso imaginar que foi uma oração bem rápida, minha avó era uma mulher prática, e não ia ficar gastando muito tempo num assunto que afinal Deus conhecia melhor que ela. E ela tinha a roça para cultivar, casa para arrumar, filhos para cuidar, deve ter sido uma oração bem sumária.

Terminada a oração ela disse ao meu avô : - vá a rua, que Deus está mandando açúcar para nós. E era assim mesmo que ela falava quando acabava de fazer uma oração.

Vovô pegou seu chapéu de palha e saiu. Como não fazia idéia do lugar em que Deus iria agir, ficou andando a esmo. Passou um caminhão.

Meu avô não sabia, mas vocês que estão lendo saberão antes dele: o caminhão vinha abarrotado de açúcar. Talvez os usineiros estivessem fazendo uma de suas retiradas estratégicas do produto. O caminhão vinha com sua carga escondida por lonas, fortemente amarradas. O que vovô contava, é que numa curva malfeita, num sulco da estrada de terra, isso ele não se lembrava muito bem, o caminhão deu uma tombada feia, quase se desequilibrou, mas enfim se aprumou e seguiu seu destino.

Mas nessa virada deixou cair sacas e sacas de açúcar.

Vovô voltou correndo e avisou a todos. O açúcar era bastante para toda a população daquele pequeno povoado. Todos vieram com suas vasilhas. Tinha açúcar para todo mundo.

Vovó Maria Luísa conta que encheu várias vasilhas e panelas com açúcar, o bastante para enfrentar toda aquela crise de abastecimento.

Isso de panelas cheias através de milagres é coisa antiga na minha história, não é mesmo?

Era Elias, já ensaiando os passos para chegar até mim.




 

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

A liseuse



Você sabe o que é uma liseuse? Se você for mulher e não souber, fique tranqüila. Se for homem, preocupe-se menos ainda. É uma informação inútil, provavelmente você jamais irá precisar, mas mesmo assim vamos a ela: era uma peça de vestuário, tipo um mini chale, que mulheres finas e recatadas usavam por sobre a camisola. Isso quando precisavam receber visitas se estivessem acamadas. Não é elegante demais?

Junto com esse, possuo um vasto cabedal de conhecimentos, todos dizendo respeito à postura de mulheres recatadas. Fui educada também pela minha titia Amélia, a última das damas recatadas que conheci. Morreu casta, coitadinha.

Pois eu tive a minha liseuse, e não via a hora de ficar doente para usá-la. E a hora chegou quando fui operada das amídalas, é, isso também me aconteceu. Fiquei na caminha toda orgulhosa, com minha liseuse de crochê amarelinha, isso para gozação das primas que me achavam uma boba, mas bobas eram elas, que não eram queridinhas da titia Amélia.

Mas hoje eu não chamei vocês aqui para falar da minha liseuse, se bem que já falei. Nem para falar dos predicados da tia Amélia, se bem que ela dava um post daqueles. Fico devendo. Ela partiu para a glória há três anos, exatamente no dia, hora e minuto da entrada da primavera. Claro, uma flor.

Chamei vocês aqui para dizer que titia Amélia me educou para um mundo que não existe mais, e isso já desde boa parte do século passado. Poderia ficar aqui um tempo enorme falando do que ela me ensinou, mas é inútil – nada daquilo serve para mais nada, acreditem.

Para vocês entenderem do que estou falando, vou contar um ensinamento só: titia sempre me levava com ela às compras, que naquele tempo se fazia no centro de São Paulo. E junto com observações sobre como caminhar com elegância, falar corretamente e baixo, sentar com discrição e outras coisas mais, ao andarmos nas ruas ela dizia:

- Se você estiver andando numa calçada, e sem querer o seu olhar coincidir com o olhar de um cavalheiro, você deve imediatamente abaixar o seu olhar. Mulheres de bem não fitam homens nos olhos quando andam na rua. E ela chamava homens de cavalheiros, vejam vocês.

E não é que eu incorporei esse hábito, que para mim é tão natural como piscar?

Então vocês já entenderam qual a reclamação de hoje, não entenderam? Preciso me destiamelizar!

Titia Amélia que está nos céus, rogai por mim para que eu deixe de ser assim.

Porque os moços bonitos estão por aí, titia Amélia, pelas calçadas. E eles não dão a mínima para moças que andam, falam e sentam com elegância, essa bobajada fora de moda. Noto até que aquelas que fazem tudo isso ao contrário são as mais populares. E para aquela que abaixa os olhos titia
, a fila anda.


terça-feira, 21 de outubro de 2008

A mão e a luva

 Certa feita (tive um pastor que pregava assim) assisti a um filme com Marcelo Mastroianni, onde o personagem que não lembro o nome surtava por não poder calcular a quantidade de ar que cabia num balão, uma bexiga de borracha. Não lembro o nome do filme, isso foi há muito tempo.

Entendo ele. Minha cabeça também dá voltas em torno de questões sem pé nem cabeça desse tipo.

Já andei por aqui utilizando a quota de paciência que vocês me dispensam com questões de direito esquerdo, espelho do lado de cá e de lá, direito e avesso, bobagens desse tipo. Então para arrematar (espero) essa seqüência doida, vou contar a mais maluca de todas, e lá vai ela:

Se eu puxar uma luva da mão esquerda pelo sentido do avesso, ela se transforma em uma luva para a mão direita. Ou vice versa.

Isso significa que toda eu sou uma fôrma, um molde para o meu próprio avesso?

Isso significa que toda eu tenho em mim mesma o potencial para ser o meu contrário?

Me acompanhe: faz de conta que eu sou uma enorme mão, e todo o espaço físico ao meu redor é a luva. Se esse espaço for puxado de baixo para cima de mim pelo avesso, teremos um vasto mundo do meu contrário de um lado, e eu sozinha do outro como molde?

Isso significa então que eu sou o centro de tudo, e todo o mundo ao meu redor é o meu avesso?

Ai meus sais! Ai meu carbolitium!

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

A chuva da fé ou a saladeira ou o moço bonito

Chovia a cântaros, e aquele templo da igreja universal me pareceu ótimo para esperar a chuva passar.

Tenho um respeito por templos que é ancestral, veio a mim através de avós, tias, mãe, enfim, vem de longe. Já visitei templos de diversas religiões, e a minha postura é sempre me comportar de forma adequada, isso significa fazer o que todos fazem dentro do possível, e nada de zombarias. Meio difícil às vezes, principalmente nas neo- pentecostais, mas resolvi me compenetrar, e fazer o que fazia a maioria dos presentes.

E a maioria estava justamente se concentrando nas cadeiras da frente, porque parecia que um cultinho ia começar. Digo cultinho porque era um povinho, umas poucas senhorinhas velhotas, uns três ou quatro homens.

O pastor ou sei lá o nome do cargo que ocupava um rapazinho engravatado aparentando ser muito inexperiente, nos chamava a ir lá para a frente tropeçando muito na língua pátria. Mas falar bonito não é predicado em questões de fé, então vamos ver o que esse mocinho tem a dizer pensei, me acomodando nas cadeiras indicadas.

Na verdade ele não disse, ele foi distribuindo uns papeizinhos, e pediu que lá anotássemos os nossos problemas. A princípio achei o papel pequeno para os meus problemas, mas reavaliei a situação e vi que meu problema naquele momento era um só, e escrevi: chuva.

Pediu que todos levássemos os papéis no altar, que era uma mesa dessas plásticas de churrasco, coberta com uma toalha rendada. Por sobre a mesa, havia uma tigela transparente, que nós lá em casa usamos para fazer salada. Cheia de água. E foi falando de uma passagem bíblica onde Deus nos prometia que os nossos problemas seriam jogados no fundo do mar. Na verdade a palavra certa seria “pecados”, mas quem disse que pecado não é um problema? É tudo uma questão de interpretação, pensei. Vamos ver o que acontece.

Cheio de fé, o mocinho pediu que colocássemos lá os papeizinhos, já crendo que a resposta estava a caminho. Depois a pedido dele ficamos ali, em roda. Ele estendeu as mãos sobre a saladeira que simbolizava o mar, numa contundente oração, e eu fiquei lembrando que quando brincava de mágica com meu irmão, também estendia as mãos sobre a mágica a ser feita de forma semelhante. Só que a gente falava alakazan.

Acabada a oração, ele mandou que cada um desse o testemunho sobre a graça recebida.

Rápido assim? Ai Jesus, com essa eu não contava.

Uma velhinha passou a falar que tinha entrado ali com uma dor no ombro, e que pá pá pá... Outra velhota narrou uma dor curada ou na cabeça ou nos rins, não me lembro, e assim foram todos, e eu já me preocupava porque ia chegando a minha vez. Todos estavam com seus problemas resolvidos, eu tinha que ser rápida, falaria o quê? Quando a última pessoa falou, todos olharam para mim. Foi então que olhei para fora, e vi que a chuva tinha cessado.

- Olha, irmão (eles gostam de ser chamados assim não é mesmo?), quando eu entrei aqui, estava com uma grande preocupação, mas ela já passou completamente.

- Amém! Aleluia! aquela coisa toda.

Devidamente aleluiada, tratei de sair dali rapidinho.

Acho que utilizei mal aquele instante abençoado. Deveria ter deixado a chuva chover, e jogado a minha solidão no fundo da saladeira, digo, do mar. De repente um certo moço bonito talvez passasse a me olhar com outros olhos, o que cá pra nós seria mais do que milagre, seria um milagre e uma mágica, os dois juntos.

Se desse certo, o bispo me teria entre suas mais fiéis seguidoras.


 

domingo, 12 de outubro de 2008

A indigestão

 Eu, fulano de tal, que assino abaixo, chefe desta família, por ser um imbecil completo, um idiota, uma múmia desenrolada, me confessando incompetente para cuidar desta casa e desta família que eu mesmo constituí, e dos familiares que são meus dependentes, mas no intuito de buscar um bom gerenciamento desta casa e de nossas finanças, declaro que acabo de contratar um Gestor Administrativo, e que após inúmeras análises e estudos feitos por ele e sua equipe, com base em parâmetros mercadológicos e institucionais, com utilização de um ferramental adequado às necessidades de nossa família, sempre com foco no resultado que é o bom andamento de nossas atividades, deliberamos o que se segue:

ALIMENTAÇÃO:

Cada morador terá direito a uma quota de oitocentas calorias diárias, distribuídas em três refeições. A partir desta data está terminantemente proibida qualquer refeição fora desses três horários, exceção feita, ocasionalmente, a um biscoito. Cada morador terá direito a um pacote de biscoitos por bimestre. Esclarecemos que somente serão servidos nas dependências da casa biscoitos de maisena ou água e sal. O morador que exceder a quota diária de calorias perderá direito aos biscoitos. Informamos que após as oito horas da noite a geladeira estará fechada com cadeado, e as chaves ficarão em poder do puxa-sa..., ou melhor, do morador de confiança escolhido pelo Gestor. A geladeira somente poderá ser aberta após esse horário com autorização concedida por um médico plantonista da rede pública, com firma reconhecida, acompanhada do formulário interno verde de requisição. A quantidade de calorias ingerida nessa situação será descontada da quota do dia seguinte.

HIGIENE

Cada morador terá direito a um rolo de papel higiênico por bimestre, concedido após ter sido preenchido o formulário próprio de requisição. As moradoras não terão direito a xampus e condicionadores ou sabonetes de marcas especiais, todos utilizarão os produtos fornecidos pela Gestão, de marcas notadamente econômicas que existem no mercado.

No início de cada mês, cada morador preencherá o formulário azul, especificando os horários de banho e utilização do banheiro. O morador que por algum motivo perder esses horários, perderá o direito à utilização do banheiro daquele dia, precisando aguardar o dia seguinte.

O horário de banho será de dois minutos para os homens e três minutos para as mulheres. Informamos que os chuveiros estão sendo adaptados a mecanismos com dispositivos apropriados para regular o tempo do banho, que serão controlados diretamente pelo Gestor.

LAZER

Informamos que estamos bloqueando o uso de aparelhos eletrônicos nos quartos, liberando um aparelho de tevê para a sala de estar, do horário das oito da noite as oito e trinta, sempre em TV educativa. Será colocado um aparelho alto-falante na casa, com música orquestral. O programa Café com o Presidente é obrigatório a todos. No final de cada semana, todos preencherão as planilhas de acompanhamento, explicando detalhadamente ao Gestor a programação ouvida e assistida. Cada morador terá direito ao aluguel de um filme por bimestre, para tanto preenchendo a requisição rosa, que poderá ser locado somente após autorização expressa do Gestor, lembrando que somente será permitida a locação de documentários ou vídeos educativos. E por ser o computador uma ferramenta essencial ao serviço de gestão, essa máquina será utilizada somente pelo Gestor. Nem mesmo o chefe da família terá direito a ela a partir desta data. Está proibido terminantemente o uso de vídeo game.

VESTUÁRIO E COMPORTAMENTO INTERNO

Está terminantemente proibido o uso de shorts, bermudas, blusas de alcinha, camisetas e tops. Todos terão de usar camisas abotoadas até o pescoço. O morador que for visto deitado no sofá da sala terá um dia de expulsão da casa. Deitar com sapatos ou tênis na cama ou sofá dará de três a cinco dias de expulsão, a critério do Gestor. O morador que deixar toalhas molhadas sobre a cama perderá trezentas calorias em sua próxima refeição.

REUNIÕES DE AVALIAÇÃO

Todos domingos às sete horas da manhã, será realizada uma reunião de avaliação da semana, onde todos os moradores já deverão estar com suas planilhas de acompanhamento preenchidas, onde serão reavaliadas e revistas as demandas da semana, sempre com vistas ao aperfeiçoamento da gestão e do grupo. Aos moradores que tiverem cumprido pontualmente todas as etapas serão atribuídos pontos. Com o total de cem pontos, o morador terá direito a um pacote de biscoitos extra. O morador que alcançar cento e vinte pontos terá a liberdade de escolher entre biscoito maisena ou água e sal.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Elias, Eliseu, e a minha jarrinha

 Já vi muito pastor confundir Elias com Eliseu em suas pregações. À parte o baixo envolvimento bíblico da maioria desses pastores, dou um pouco de razão para eles. São nomes parecidos, foram da mesma época, e ambos se envolveram em questões de viúvas e azeite.

Elias, o patrono deste blogue e desta viúva que aqui escreve, como eu não me canso de falar, foi aquele que se hospedou por um bom tempo na casa de uma pobre mulher, e durante todo esse tempo a farinha e o azeite daquela casa não acabaram. Creio que mesmo após sua partida, as coisas por lá continuaram abençoadas, porque Elias sempre volta, e se ele volta aqui neste confim de mundo, quanto mais lá em Sarepta, onde tudo começou.

Um dia porém Elias saiu de cena, em nada menos que um carro puxado por cavalos de fogo, vocês acham que eu ia escolher qualquer um para meu patrono? Mas ele deixou um sucessor, isso porque naqueles tempos a coisa não era essa maravilha que é hoje, ou seja, Deus não falava com qualquer um. Hoje Ele fala até comigo, imagina. Elias antes de partir passou seu poder para Eliseu, que ficou em seu lugar. Certo dia, então, Eliseu foi procurado por uma desesperada viúva.

Seu esposo acabara de morrer, e os credores estavam na porta para levar seus dois filhos. Naqueles tempos a coisa funcionava assim. Se não havia dinheiro para quitar uma dívida, o devedor e seus filhos eram levados como escravos. Já pensaram se fosse hoje? Eu há muito que seria escrava do Banco Itaú. Meu filho, coitadinho, estaria quebrando pedras em alguma pedreira da Telefonica. E meus pais idosos, os pobres, estariam atados com grilhões e bolas de chumbo nas senzalas do senhor Samuel Kleinn, o dono das Casas Bahia. E ainda tem gente que reclama dos dias de hoje...mas eu estou fugindo do assunto. Continuemos.

Eliseu perguntou à viúva: - você tem alguma coisa de valor em sua casa? Ela respondeu que tinha uma jarrinha de azeite, o azeite de oliva era mercadoria preciosa naqueles tempos. Eliseu disse a ela que saísse pedindo emprestadas vasilhas e jarros de todas as vizinhas, o mais que pudesse. E lá se foi ela, a encher sua casa de potes, jarros, gamelas, panelas, vasilhas de todos os tipos. Eliseu falou: chame seus filhos, feche a porta, e com a ajuda deles vá despejando a jarrinha de azeite que você tem em todas essas vasilhas. Imaginem aquele mar de vasilhas espalhadas pela casa. E deu certo. A viúva só acabou de despejar o azeite porque acabaram as vasilhas. Então Eliseu disse: venda esse azeite, pague sua dívida, e viva você e seus filhos do que sobrar. Devia ser uma importância muito alta. Final feliz da bela história.

Nunca lhes contei, mas Eliseu já passou em casa, numa época em que Elias andava ocupado. Eu tinha acabado de ganhar meu filho, o pai dele já devia estar a bordo de algum navio, meus amigos todos me abandonaram, um dia conto essa história. Meus parentes me olhavam enviesado, e um espírito de porco acabara de dar a notícia de que eu seria demitida do emprego assim que retornasse da licença. Foi nesse momento que ele chegou, e eu dei a ele a conta do meu infortúnio. Eliseu me fez a mesma pergunta: o quê você tem de seu?

- Senhor profeta, eu tenho esta jarrinha aqui. Ela contém uma pequena quantidade de coragem e fé. Era pouco mesmo. Na seqüência vocês já sabem, não é? Eu saí emprestando vasilhas, tantas que se espalharam até pelo quintal e pelo telhado de minha casa. E Eliseu me passou a mesma lição: vá enchendo as vasilhas, minha filha. Quando acabei ele disse: é disso que você irá viver, você e seu filho, até o final de seus dias.

Então essa é minha história de hoje. Espero ter ensinado você a distinguir Elias de Eliseu. E fica também o teste para identificar um verdadeiro profeta. Um verdadeiro profeta sempre se envolve em questões de viúvas e órfãos, e Jesus, o Mestre do envolvimento, não me deixa mentir; Ele inclusive ressuscitou o filho de uma delas.

Então se alguém chegar para você e disser: - venha, vamos ali, ali há um profeta, um homem de Deus, venha comigo ao congresso, ao evento, à palestra, ao show gospel, venha comigo àquela formosa igreja, vamos assistir ao famoso pregador em cadeia nacional, apenas pergunte: ele se envolve em questões de órfãos e viúvas? Quando eu falo envolver é envolver mesmo, nada de patrocinar ONGS e instituições. Se a resposta for negativa, o melhor que você faz é pedir uma pizza, alugar um filme e ficar em casa com sua família, e seguramente com Deus.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008



Adoro a palavra cachorro, acho gostosa de pronunciar. Gosto de cachorros também, muito.

A palavra música me perturba. Logo me vem à cabeça a imagem de uma mulher idosa, de cabelos brancos, nua em pelo sentada no sofá da sala.

A palavra filigrana eu não faço a mínima idéia o que significa. Mas me sugere docinhos de massa folhada. Aceita umas filigranas? Humm, essas filigranas estão ótimas...

Subterfúgio é uma palavra que me leva a labirintos, aqueles onde a pessoa se perde para sempre, como em Borges: fulano entrou num subterfúgio e nunca mais voltou...

Acho trombone uma palavra ótima, combina perfeitamente com o próprio. É uma palavra barulhenta. Um trombone não podia se chamar, por exemplo, abacate. E falando em abacate, sempre que ouço a palavra imagino o abacate caindo da árvore, produzindo esse som: abacate!

Odeio a palavra pechinchar, como também odeio pechinchar. Se não tiver o dinheiro, eu não compro.

Tinha uma coisa bacana pra falar da palavra mormaço, mas infelizmente Mário Quintana já teve essa idéia antes de mim, e não vou contar não, vá ler suas obras completas, ao invés de estar perdendo seu precioso tempo aqui.