sábado, 28 de fevereiro de 2009

A tangerina roxa...continuação

2.
A
nossa história já começa com uma lamentável omissão: não posso contar o nome do lugar onde se localiza a comunidade. Se por um lado isso é ruim, pois dificulta a autenticação da narrativa, por outro é bom porque vai dar munição aos incrédulos, e com isso eu jogo limpo. Os incrédulos na maiorias das vezes têm razão, por isso eles também são benvindos aqui, e esta história já começa de fato mal contada. Mas Lidia pediu que eu desse minha palavra de que não contaria a ninguém a localização, e eu não brinco com essas coisas, e eu me comprometi com eles também.

Eles eram os tais administradores vindos do espaço, mas eu estou indo muito rápido. Voltemos.

Eu tinha um bebê pequeno para deixar com alguém, então tratei de inventar uma formidável mentira para minha mãe, do contrário ela teria me internado.

Eu estava muito insegura. Claro que quando o assunto era Lidia, nada me surpreendia. Ela vivia enfurnada em templos budistas e outros, frequentava palestras, vivências e workshops esotéricos de todo tipo, já tinha passado semanas meditando no planalto central, e inúmeros outros pontos considerados energéticos, já tinha viajado até a India para conhecer gurus, não havia novidade alguma dentre os ensinamentos místicos que ela não conhecesse e acompanhasse. Eu não a acompanhava porque tinha um filho pequeno, mas não só. Achava muita maluquice, aquela salada de conhecimentos. Mas eu tinha muita curiosidade, então ela ia me contando tudo, até o dia em que ela se cansou de me contar, disse que se eu quisesse que passasse a seguir de fato aqueles caminhos todos, e foi aí que nos separamos. Eu optei por não seguir nenhum daqueles caminhos, creio que isso a deixou decepcionada.

Contudo eu respeitava as suas buscas, mas aquilo já era demais. Eu sabia que ela andava pelas matas à procura de ETs, conhecia o grupo de caçadores de ETs com quem ela andava, já tinha estado com eles, ouvido algumas de suas palestras, achando até muito interessantes. Sabia que havia um senhor publicando livros falando sobre contatos que tinha feito com seres do espaço, com um número bem razoável de leitores, mas tirar aquilo tudo das páginas de livros ou de grupinhos fazedores de contatos e passar para uma realidade como uma comunidade agrícola com seres do espaço me soava no mínimo como uma grande enganação, para não falar que me soava como coisa de doido mesmo.

Mas a curiosidade venceu, a mesma que trouxe vocês de volta, e inventada a mentira, deixado o bebê, arrumada a mala - leve roupas leves de cores suaves ela disse, e perfumes, eles gostam de perfumes, eu fui.

Continua...

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

A tangerina roxa

 
Foi numa véspera de carnaval que minha amiga e professora Lidia Zózima me fez o mais inusitado dos convites:

- Betinha, você gostaria de vir comigo a uma comunidade agrícola administrada por seres extra-terrestres? Falou assim, tranquilamente, como quem convida uma amiga para ir às compras...

Amigo leitor que me acompanha até aqui, e que gasta o seu precioso tempo acompanhando as reclamações, aventuras e desventuras, mais essas últimas, de uma pobre viúva, eu tenho duas coisas a lhe dizer. A primeira é: muito obrigada. Já estamos caminhando para um ano de queixas enfarinhadas, e a cada dia eu me pergunto porque vocês insistem em voltar. Só posso concluir que vocês são pessoas adoráveis, quem mais continuaria por tanto tempo lendo historinhas regadas a pouquíssimo azeite e farinha quase nenhuma?

A segunda é: isto aqui é um blogue. Se fosse um livro você poderia fechar, atirar num canto e dar por encerrado o assunto. Mas acalme-se, aqui você sempre tem a opção de clicar no x vermelhinho e pular fora.

Porque eu tenho certeza de que você pensou: agora a Bete pegou pesado. Comunidade agricola administrada por ETs?! Blogagem tem limites!!!

Então ficamos assim: vou parar por aqui, assim você não precisa clicar no x vermelhinho. Você já vai procurando outro blogue, de preferência mais sério para visitar, e vai pensando seriamente se já não está na hora de rever seus conceitos sobre escolha de blogues. E eu vou tomar fôlego para contar essa história, porque você pode estar certo de que eu vou contar, mesmo que seja para as paredes do blogue.

Se a sua curiosidade for maior do que a sua incredulidade e você voltar, eu posso garantir que você poderá até não acreditar no que vai ler.

Mas vai gostar muito.
Continua...



 

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

O pão nosso

 Foi então que um executivo de uma empresa brasileira de presuntos, mortadelas, salames e essas coisas aí, marcou uma audiência com Sua Santidade o Papa.

- Papa, foi logo falando após beijar-lhe o anel, é o seguinte. Eu queria que Sua Santidade falasse, na oração do padre nosso, ao invés de o pão nosso de cada dia nos daí hoje, o peito de peru nosso de cada dia nos daí hoje...

O papa ficou apoplético. Perdeu a respiração, perdeu a fala. Veio o copo com água numa bandeja de prata. Sua santidade ficou tão nervoso que falou misturando latim e alemão:

- Ave chucrutz, ora pro nobis volkswagen, mea culpa oktoberfest!!! E em seguida passou para a boa gíria brasileira:

- Que tém, lôco? Pirrou no batatinha???

O brasileiro, imperturbável:

- Papa, eu pago um milhão de euros...

O papa não quis nem ouvir, e continuou esbravejando na língua de Goethe, ora ponha-se daqui para fora, não me apareça mais aqui!

Mas o sujeito como eu disse era brasileiro, e brasileiro não desiste nunca. Tanto que voltou no dia seguinte, e no outro, e no outro. E a cada vinda, aumentava ainda mais a proposta.

Um dia o brasileiro se encheu:

- Papa, vou fazer minha última oferta e dou vinte e quatro horas para sua decisão: Cinquenta milhões de euros, mais dez por cento de todo o meu faturamento anual, até o final do seu papado. Beijou o anel de Sua Santidade e se foi.

Silêncio total na sala de audiências. Então num suspiro o papa se vira para o cardeal e diz:

- Acho que vamos ter de rescindir nosso contrato com a Pullman...

Huáhuáhuahsussususshuá embora trabalhar cambada de blogueiro desocupado!!!!

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Fronha bordada (agora com a foto...)

Eu dou casa
eu dou comida
eu dou roupa lavada,
eu te dou tuas camisas limpinhas
passadinhas, no guarda roupa,
cheirando a Confort, duvida?
duvida não, que eu posso dar...

Eu te bordo a fronha, ponto paris
duvida? Pois não duvida não,
que eu sei bordar...

Eu trabalho procê não trabalhar
duvida?
cas’ de família
faxino três por semana
só procê ficar assim
pertim de mim
papo pro ar...

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Procuro debalde

Procuro por uma música chamada Barrabas, assim mesmo, sem acento, é erudita, pode ser de Berlioz. Não tenho certeza. É sinistra, adoraria ouvi-la novamente.

Falando em música, procuro também pela execução de hinos do Hinário Evangélico Metodista na forma de música indiana. Ouvi uma única vez, na Rádio Cultura FM. Nunca dei sorte em conseguir coisas junto aos funcionários daquela emissora.

Procuro pela receita de uma Pêra Bêbada, que comi faz um tempão, num restaurante ali pela Avenida São João, cujo nome esqueci. Divina.

Procuro por um livro chamado Sparkenbroke:

“Algum mortal, em meio à humana lida,
Lamenta acaso quem aqui repousa?
Chora o teu próprio exílio e não a minha vida!
Com a Terra por mãe, o Sono por esposa –
Ó frios ventos hibernais, correi! –
Que a primavera aqui tem imortal guarida,
Quem é que hesita? Um tolo.
Quem é que bate? Um rei.”

Isso aí estava escrito no túmulo dele, forte não? É de Charles Morgan. Eu sei, eu sei, existe a Estante Virtual. Preguiça...

Procuro por uma caixinha de música que toque Pour Elise, essa até que é fácil, era só sair procurando mesmo...

Falando em procurar, procuro trabalho também...

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

A volta do moço bonito




Cyrano de Bergerac é a história de um espadachim, na Paris de 1640. Ele é apaixonado pela prima Roxane, mas por conta de um complexo causado por um enorme nariz não se aproxima dela, preferindo amá-la à distância. Então entra em cena Cristian de Neuvilette, um jovem por quem Roxane se apaixona.

Ocorre que Cristian não é chegado a eloqüentes declarações de amor. Quando vai ao pé da janela da amada, para fazer aquelas declarações à lá Romeu, ele diz:

- Oh, Roxane, eu te amo.

- Sim, mas amas-me como? Fale mais do seu amor por mim...

As jovens daquele tempo não eram nada diferentes das de hoje, adoravam enrolação. A coquete queria ouvir belas falas, de luas e brisas, sonhos e rouxinóis, murmúrios de cascatas e raios de sol nascente, corações partidos e quejandas. (Sempre quis usar a palavra quejandas, para ser sincera nem sei realmente se essa palavra existe)

É nesse pé que aparece Cyrano, que além de ter um enorme nariz, tem também uma fina eloqüência, cheia de charme, e resolve ajudar o atrapalhado jovem. Envolto em sua capa, oculto nas sombras das folhagens, ele vai ditando ao jovem palavras cheias de amor e encanto, para agradar aos ouvidos da formosa dama. Então ocorre que Roxane se apaixona cada vez mais pelo paspalho, achando que as palavras de Cyrano são dele, sem saber que no fundo está se apaixonando é pelo dono das belas palavras.

História bacana pra caramba, eu se fosse você garimpava e lia.

Blim, blom! É a campainha aqui de casa. Ela não faz exatamente blim blom, mas vamos em frente. Atendo.

Dou de cara com o moço bonito, materializado em calça e jaqueta jeans. Os olhos bonitos estão protegidos por óculos escuros. Óculos bonitos, claro.

- Então, é isso aí...estou aqui...o que você quer?

Se não falei falo agora, o moço bonito é econômico nas palavras, e já foi direto ao assunto. É o caso que ele deve ter se cansado de eu te amo de cá, eu te amo de lá, e veio aqui para conferir o resto do discurso. E ele está de mochila!

Ai valei-me minha santa Madalena!

- Entra... er...está um calorão não? Ontem parece que ia chover, mas não choveu, de noite esfriou, hoje parecia que ia fazer frio o dia até amanheceu meio friozinho mas agora, calorão né? Mas a previsão do tempo disse que talvez chova, se não chover hoje com certeza chove amanhã...

Entenderam o tamanho do meu problema? O meu discurso começa e acaba no eu te amo, parva feito um Cristian de Neuvillette. Eu ia precisar no mínimo de uma Alice Barollo escondidinha atrás do sofá ou da estante, pra ir me soprando as românticas frases para esticar o assunto, para desdobrar o eu te amo, por assim dizer.

E o que dizer então de atualidades, ou papo cabeça? Sim, porque também esqueci de dizer que o moço é culto...

Minha conversa seria do tipo tem aquela música aquela que começa assim nã nã nã ...esqueci, e tem aquele cara, aquele que escreveu o livro lá que todo mundo leu, e aquele filme, aquele da trilha que a moça loira gravou que não lembro o nome, e aquele quadro, aquele do nariz torto que está naquela galeria lá, e o presidente, aquele do país lá que falou na assembléia lá, e o sujeito que ganhou o prêmio aquele prêmio, sabe?

A Jeannie do seriado fazia acender um letreirinho para o major Nelson ir lendo quando havia alguma enrascada desse tipo.

Mas eu não tenho Jeannie, não tenho Alice Barollo, ainda não inventaram um chip de google pra gente instalar na cabeça, meu vocabulário poético é pobre pra caramba, então acho melhor o moço bonito ficar onde ele está.

Senão eu vou ter de investir num teleprompter...

O George Constanza, meu herói, meu ídolo, o fracassado dos fracassados da série Seinfeld namorava por telefone, e ele tinha um caderninho com um roteiro de assuntos. O pior é que eu também já fiz isso, e mais de uma vez...isso no tempo em que não havia MSN, porque bater papo cabeça ao MSN ao lado do google é facinho, facinho...

É...meu caso é mesmo perdido. Vida real ao vivo e a cores não é comigo...Então continuo aqui no meu bloguinho, mandando ver nos meus eu te amo à lá Neuvillete...

Mas quem sabe o moço bonito não seja tímido também...e que seja bom em caminhar por aí falando bobagens sem pé nem cabeça, achando graça em formato de nuvem, contando de tombos levados na infância, explicando o porquê daquela cicatriz, cantarolando em inglês enroleichom, parando numa barraquinha de tapioca, tudo como eu gosto de fazer... então eu teria até ter coragem de contar que uma de minhas maiores distrações quando ando por aí é ler letreiros de traz pra frente...

É...vamos continuar com os eu te amo. Nunca se sabe, nunca se sabe...

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Ahh...


Você não faz idéia (e com acento)
você não é capaz de imaginar
de medir
de mensurar
o tamanho
das saudades (assim, no plural)
que me dá um caroço de pêssego
na garganta
que mareja o astigmatismo das minhas lentes
não, você não imagina

o tamanho das saudades
o tanto que eu gostaria
de ver você, só um tantinho, cinco minutinhos
podia ser eu atrás da coluna
você não precisava nem
me ver.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O texto escrito na minha opinião deve...

O texto escrito na minha opinião deve escorregar. Um parágrafo precisa levar o leitor ao outro parágrafo.

As letras na minha opinião devem ser grandes, redondas, nem todos conseguem ler letras miudinhas, devemos pensar nisso.

E o vocabulário? o vocabulário é tão rico, por que não escolher as palavras mais macias? mais suaves?

Por que não espaçar mais, não virgular mais?

Dentro de um texto deve haver rima, não aquela rima de amor com dor, mas uma rima escondida, misteriosa, que só você conheça mas que todos sintam, que encadeie as palavras umas às outras com suavidade, sem deixar o texto pesado, que seja bom de se ler em voz alta.

Leia em voz alta aquilo que você escreveu. Se você ficar cansado, é que o texto seguramente não está bom.

(Esse "seguramente" entrou aí só para dar sonoridade à frase, sentiu?)

Ah, vamos combinar, nada pior do que provar um pão pesado, embatumado, mal assado. Ih, rimou...

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

O feitiço do tempo

 O feitiço do tempo é um filme que toda pessoa estressada com sua rotina deveria assistir. Conta a história de um jornalista encarregado da previsão do tempo que detestava seu trabalho. Então o tempo pára, (impossível não acentuar) e ele se vê repetindo dia após dia as mesmas cenas de sua enervante rotina até que...bem, assista.

Trabalhei por quase duas décadas na gerência de agências bancárias, lidando com clientes mal humorados, irritados, irritantes, estressados, mal educados de todo tipo, em sua grande maioria. Odiava meu trabalho. Mas talvez por isso mesmo não conseguia me libertar.

A sensação é que se fica preso num hiato de tempo, como no filme, e que é preciso descobrir qual a chave que abre as portas da prisão, sob risco de se ficar para sempre lá.

Algo assim como: você irá ficar aí até aprender qual a lição a ser aprendida. Até superar, mais, até transcender.

Quanto mais odiamos situações que nos chegam e não as analisamos, quanto mais evitamos o esforço para entender porque elas ocorrem, mais situações semelhantes teremos até que...até que aprendamos. Ou não.

Há pessoas que não aprendem jamais.

Conheça-se, é a chave. Analise todas as situações de sua vida dentro e fora dos contextos. Em estatística há um fenômeno chamado moda. Todo evento que se repete com frequência deve ser mapeado, analisado, comparado. Estude sua vida, administre-a. Tome as suas chaves na sua mão.

Não fique à mercê do acaso. Não fique à mercê do tempo. Pode demorar, pode nem vir.

Eu me libertei daquela rotina estressante, um dia ainda conto como foi essa história.


 

domingo, 8 de fevereiro de 2009

A vespa



Uma noite estávamos na sala em casa eu, meu bebê, meus pais e mais duas pessoas. Foi então que pela janela entrou uma enorme vespa, que foi direto ferroar o dedão de minha mãe. Quando fui tirar o ferrão do dedo dela me assustei com o tamanho, tinha um centímetro.

A coitada da minha mãe saiu-se com essa pérola: "ainda bem" que fui eu, já pensaram se fosse o nenê?

Pensamento bobo, não precisava ser ninguém...

Noto que há pessoas que desenvolvem vocação para vítimas. Estou aqui para morrer no lugar da humanidade, parecem dizer. Estou pronta para ser imolada na pira sacrificial, meu chamado neste mundo é para sofrer, tudo bem, eu sofro resignada...

Essas pessoas atraem todo tipo de acidentes e situações estranhas. Convenhamos, um vespão não faz parte do ecossistema de nosso quintal, temos moscas, pernilongos, borboletinhas, pequenas aranhas, ocasionalmente até abelhas mas são mansas. Meu pai, antigo sertanejo, com experiência em bichos, analisou a vespona e disse que nunca tinha visto daquele inseto por nossos lados.

Claro, ela veio voando sob encomenda de minha mãe. Vespão delivery.

Seis pessoas numa sala e uma é picada. Poderia ser uma enorme coincidência, se não existissem pessoas que parecem que estão pedindo para serem picadas. É o caso de minha mãe, tudo acontece com ela.

Essas pessoas vivem dizendo justamente isso: tudo acontece comigo. Se falarmos que elas atraem, ficam zangadas conosco, então eu fico quieta. Mas acredito.

Deve ser algum monstruoso complexo de culpa, pessoas que acham que precisam expiar de algum modo seus mirabolantes pecados. Elas precisam sofrer, precisam pagar. Então haja insetos, cachorros bravos, assaltantes,chefes tirânicos, cônjuges cruéis, acidentes domésticos e de trânsito, a lista é grande.

É como se elas andassem com um cartaz pendurado ao peito: não presto, sou um lixo, bata-me, chute-me, maltrate-me.

Nos seus relacionamentos amorosos, é certeza que atrairão companheiros que as hostilizarão. Um após o outro.

Jesus disse que a verdade liberta. Conheçam a verdade, Ele disse, e a verdade vos libertará.
E ao pobre paralítico que foi colocado em sua frente, descido por cordas do telhado, ele perdoou os pecados antes de curar. Com esse gesto Jesus mostrou que uma alma atordoada pela culpa é tão ou mais sofredora do que um corpo entrevado.

Perdoe-se. Aquilo que você fez errado ontem, é passado, não volta, não há como consertar. Arrependa-se, corrija-se, siga em frente. Você não precisa pagar,não precisa sofrer, não precisa expiar, liberte-se dessa teologia da culpa, de pecado e de castigo.

E conheça-se. Antes de expulsar a legião de demônios ao pobre gadareno, Jesus perguntou-lhes o nome. Uma vez conhecido o nome daquilo que lhe atormenta, você já o desmascarou. Descubra um a um o nome de todos os demônios que você está hospedando, e ordene a eles que saiam de sua vida.

Complexo de culpa, fora daqui! Preguiça, indiferença, desamor, medo, ira...vá identificando e expulsando esses e outros bichos de sua vida, e saiba reconhecer suas manias para o caso de algum querer voltar. Líder religioso nenhum fará isso por você, por mais que muitos digam que sim.

Foi isso que o Mestre quis dizer quando falou que a verdade liberta. E quando você se sentir livre dessas vespas, quando você deixar de receber suas ferroadas, você entenderá de fato o que Ele quis dizer.

Alma leve, livre, em paz, reconciliada.Leveza. Foi esse o legado que o Mestre quis nos deixar.

Uma recomendação: antes de sair de sua vida, esses demônios emitem um último brado, terrível, não caia nessa, é truque, é para lhe assustar. É o grito da derrota, é sinal de que eles já perderam.

O ponto mais negro da noite fica a um tantinho da aurora.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Salve, Maria




Entrei numa maternidade pela primeira e única vez numa fria manhã de domingo, decidida a sair de lá com meu filho nos braços. Sabia que estava na minha hora e sabia que era um homem, embora não estivesse sentindo dor nenhuma e não tivesse pesquisado o sexo dele, respectivamente.

Minha médica e amiga de infância Ivete Daniel nem discutiu, já estou indo pra lá, Betinha. Ela me conhecia muito bem.

- É...está na hora sim, vamos nessa!

Sentindo um mínimo de desconforto e dor enquanto aguardava, fiquei à vontade para me interessar por outras mães, e ajudá-las, pois optei em ter o meu bebê numa maternidade pública, e as enfermeiras não dispensam ajuda.

Descobri que todas sem exceção chamavam por Nossa Senhora Aparecida para socorrê-las em suas dores.

Fico com pena das evangélicas, chamar por Maria nessa hora soa tão...autêntico. Ninguém mais, ninguém menos que a mãe do próprio Cristo para ajudar nesse momento, isso é forte demais.

Maria soube o que era sofrer. Ficar aos pés de uma cruz vendo o seu filho ali encravado, desfigurado, morrendo aos poucos, é coisa para mulher valente.

A iconografia cristã que nos remete àquelas cruzes altas, recortadas contra o horizonte não me convencem, seria difícil fincá-las, creio que elas eram erguidas pouca coisa acima da estatura humana, então imagino que Maria ficou a poucos centímetros de seu filho em suplícios.

Se hoje sofremos com os probleminhas de nossos filhos trapalhões, imaginem Maria contemplando a morte cruel de um filho inocente, que era assim um...um Jesus.

Cadê os homens amigos dele naquele momento, heim? Deveriam estar vomitando longe dali, isso para não falarmos outra coisa.

Maria, a senhora foi mais macho que muito homem.

Por isso, Santa Maria, eu que transgredi sem culpa uma Lei divina na hora do parto, pois que não senti nenhuma dor, (era só o que me faltava) mas que a sinto de outras formas, com minhas preocupações, te digo: Ave! Agraciada.

Rogai por mim agora. E na hora da minha morte também, quando a minha hora novamente chegar, porque morrer não deixa de ser um parto, só que ao contrário.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Recado de geladeira

Saí para caçar
bem ali, logo ali,
que maçada.

Se tiver sorte
teremos
javali
no jantar

Do contrário,
salada.


Poema com escolha, imagine uma cumbuca onde você possa escolher.Também dá pra rimar:

que chatura com verdura
que macete
com rabanete
de novo!
com ovo



domingo, 1 de fevereiro de 2009

Sim, ainda

 Meu filho veio me dizer que não vê motivo algum para continuar vivendo, e antes que vocês digam que é deprê de rebelde sem causa, posso dizer que ele apresentou sólidos e desconcertantes motivos. Maduros demais para a idade dele, eu diria,

Como mãe fico preocupada, mas meu lado prático nota que ele ainda se preocupa com a aparência e os cabelos, então nem tudo está perdido.

Não tive grandes argumentos para discursar em prol de nossa existência, também estou nesta viagem sem bússola e sem mapa, e ao contrário de muitos que conheço, ainda nem o meu trem eu consegui pegar. Ainda estou na estação com aquele ar aparvalhado de quem está à procura de um fiscal para perguntar, senhor, de que lado fica...Enquanto muitos me sorriem e acenam das janelinhas, eu ainda não consegui sequer entender os horários da ferroviária.

Mas confesso que ainda ajeito as sobrancelhas, tinjo de castanho acaju as raízes brancas, e dia sim dia não tomo o 46 da homeopática, e isso é o mais perto que consigo chegar de uma oração. Traduzido em prece significa algo como um Sim, ainda.

Uma prima minha chegou há um tempo atrás com esse mesmo discurso sorumbático, deve ser mal de família, e eu me peguei falando que achava que valia a pena viver porque a Igreja de Cristo ainda estava aqui na Terra.

Hoje eu acho graça dessa imensa mistura de esperança com ingenuidade, e meu discurso está bem mais moderado, resumido mesmo no Sim aí de cima.

Minha pinça de sobrancelhas e meu aparato de tinturas são o meu missal e minha reza. Sim Deus, sim, um cansado sim, e ainda.

Oro para que o seu Sim seja qualquer coisa boba assim, filho querido, um curso de pré vestibular, mais uma esticada nos cabelos que você insiste em esticar, uma caminhada por aí, um Sim desses, que fazemos a todo instante.

Um dia entenderemos como isso acaba, mas eu só lhe peço: fica comigo, fica conosco, fica aqui. Vai ser interessante conhecermos juntos o fim desta história. Ou não. Mas será bom assim mesmo. Nem que seja por pura teimosia, vamos continuar essa nossa caminhada na presença de Deus, quem sabe um dia a gente não ouça dEle o seu Sim.