domingo, 28 de dezembro de 2008

Elias, os bichos do mato e o Banco Central

 Elias passou por aqui. Estava todo atrapalhado com nosso padrão monetário, querendo obter explicações sobre o nosso dinheiro. Como a explicação seria longa, e eu tinha um pão de granola ao forno, pedi a ele que sentasse. Fiz um café.

- Então, filha, começou ele. No meu tempo usávamos prata e outro, ou fazíamos trocas. Mais tarde, nos tempos de Jesus, usávamos denários com a efígie de César. Agora noto que por cada lugar por onde passo há papéis diferentes. E o que são vales? Ouço muito falar de vale isso, vale aquilo...

Por sorte eu tinha algum dinheiro em casa, coisa rara de acontecer. Fui mostrando a ele algumas cédulas.

- Onde está a imagem de César? Vocês preferem as imagens de animais do mato?

- Pois é, senhor Elias, os nossos césares de cá não ficam muito tempo no poder. Esses são animais queridos, de nossas florestas, mais admirados pelo povo do que muitos de nossos governadores...

- Que coisa triste, lamentou Elias...

- Mas assim é. E as gravuras com pessoas já causaram muita polêmica. Houve uma época em que um determinado dinheiro levou a imagem de um notável escritor e poeta do nosso país. Mas a família dele ficou inconformada, pois aquela nota, com a inflação foi perdendo o valor e...

- Infla o quê, filha?!

Ai Jesus! Como eu saio dessa?

Mostrei uma nota. Senhor profeta eu disse, todo e qualquer dinheiro neste país leva esta assinatura aqui. É a assinatura do presidente do nosso Banco Central. Banco Central é o nome da instituição que cuida para que o dinheiro não perca o valor.

- E quando um dinheiro deixa de ter valor, interessou-se Elias?

- Existem meios, eu disse, fórmulas matemáticas, de se calcular a quantidade de dinheiro que há nas mãos de uma determinada população. Se houver dinheiro demais, as pessoas podem sair comprando desenfreadamente, gerando uma crise no abastecimento, na reposição desses bens que foram comprados. Isso vai prejudicando, ponto a ponto, todo o cliclo de produção. Algo assim, se todos saírem num mesmo momento comprando azeite e farinha, esses acabarão rapidamente, e não haverá como repor, porque a plantação de trigo e azeitonas demanda um certo tempo. Haverá falta de pão.

- Por outro lado, se a moeda escassear, as pessoas não comprarão nada, a farinha e o azeite ficarão parados nas prateleiras. E lá na ponta, muito trigo e azeitonas irão se perder. Todos passarão fome.

- Então o que é preciso fazer? perguntou Elias

- Quando há muito dinheiro circulando, o Banco Central eleva a taxa de juros. Lembra da parábola do Mestre, dos sujeitos que receberam talentos do patrão para administrar? Ou você comercia com o dinheiro ou você o leva aos banqueiros, a história é sempre a mesma. Se aumentarmos demais as taxas, todos vão querer levar o dinheiro aos bancos, viver de juros, isso paraliza as atividades econômicas. Se for uma taxa baixa demais, ninguém levará o dinheiro aos bancos, que por sua vez não poderão financiar a produção, parando a economia também. É preciso então buscar um equilíbrio, uma missão difícil e penosa dos nossos governantes, aliada a muitas outras preocupações sobre o incentivo da produção, emprego e distribuição de renda. E muito mais.

- Complicado mundo novo, disse o profeta. E é esse Banco Central aqui, o César dos novos tempos, quem garante a liquidez destes papéis?

Viram como Elias aprende rápido?

Sim, eu disse. O órgão garantidor e regulador da saúde de nossa moeda é o Banco Central, o César do nosso tempo. E os papéis e moedas diferentes são as moedas divisionárias, para facilitar as transações. A menor delas é esta aqui – eu tinha um monte delas – e a de valor mais alto vale cem, é uma verdinha, muito difícil de aparecer aqui em casa...Não falei sobre uma outra verdinha, seria muito complicado explicar o que é paridade, e meus conhecimentos de economia não chegam a tanto.

- Mas você não me explicou sobre os vales, lembrou Elias.

- São moedas paralelas, eu disse. Determinadas empresas idôneas lançam esses dinheiros no comércio (felizmente eu tinha algumas), que pela sua reputação também são aceitas na compra de alimentos.

- É uma espécie de vale-farinha? (Viram?!)

- Iiiiiiisso, senhor Profeta!

Felizmente o pão de granola ficou pronto, nós o comemos com o cafezinho e Elias disse que precisava partir, não sem antes me tascar uma profecia:

- Eis que seus vales –farinha e seus dinheiros não acabararão.
Bom demais.

Da mesma série:

Elias expresso

Os anjos comprimidos