domingo, 5 de abril de 2009

Primeira carta de Bete a São Paulo

Quando eu era menina, agia como menina. Ficava horas frente ao espelho, aquilo me fascinava.

Mas não confio em espelhos, nunca confiei.

Minha mão direita é minha mão esquerda no espelho, e isso me desconcerta, sempre.


Por isso me busco tanto em Deus. Não para que me prolongue a vida, não para que me dê facilidades, não para que me livre das encrencas onde sem sua ajuda me meti.

Mas para que me revele onde está minha face sem avesso, aquela que ninguém vê.

Se eu estender as mãos a alguém como os noivos fazem no altar, minha mão direita tocará a sua mão esquerda, e essa pessoa então é o avesso de mim.


Não, não quero oferecer minhas mãos nesse altar, mesmo que o espelho seja tão belo a ponto de refletir o melhor de mim. Não quero meu avesso, quero minha plenitude.

Deus não tem mão direita, eis aqui sua mão direita. Deus não tem mão esquerda, eis aqui sua mão esquerda.


 Minha vida somente encontrará sentido quando os espelhos deixarem de existir.

Infelizmente hoje nos vemos como num espelho, Paulo. Um dia veremos face a face. Meus olhos direito e esquerdo serão os olhos direito e esquerdo seus.