domingo, 14 de dezembro de 2008

Terceiro domingo do Advento-continuação

Como descrever um som? Como colocar toda a sensação advinda de ouvir um som em palavras, sem ser um Machado, um Dickens?

Como explicar o que é acordar num susto, numa noite silenciosa, ao som de um bumbo, uma gaita, uma viola e várias rabecas?

E a recorrência mental, rápida, que uma criança precisa fazer para classificar em seu cérebro: - o quê é isso mesmo?... E isso com o coração ainda aos pulos pelo acordar ao som de um bumbo, como explicar?

Como explicar para vocês uma melodia que eu mesma já esqueci?

Era uma toada? Sim, creio que era uma toada.

Mais fácil seria recorrer a uma ferramenta de busca, mas não quero, meu Deus, eu não quero, quero falar por mim, mesmo correndo o risco de deixar vocês com uma explicação distorcida de confusa.

Mas tenho de confessar, fui ao You Tube, para onde mais iria eu? E o mais perto que cheguei foi justamente essa canção que toca ao fundo, aumente o som. Ouça, nem que seja pelo menos uma vez as músicas que posto aqui. Há dias em que elas falam mais do que vai no meu íntimo do que os meus textos, e me entristeço ao constatar que quase ninguém percebeu isso.

A canção em estilo de toada, tinha quadras, e o final do último verso de cada quadra se encerrava num lamento, um AAAAAI!!!

Como descrever esse AAAAAAI entoado por vários homens, a quatro vozes, muitos fazendo as vezes de soprano, como descrever isso meu Deus, como?

Eu que sabia cantar em grupos a quatro vozes, conhecia a dificuldade dos ensaios ao pé do órgão; como aqueles homens rudes do sertão acertavam fazer aquele belíssimo contracanto sem estudo algum?

Fico devendo. Jamais conseguirei escrever sobre aquela emoção à altura dela.

E Deus fica me devendo também. Não há registro, os santos oráculos da net não me disseram nada, os homens morreram todos, foi-se de minha memória o verso e a rima.

Ficou só a sensação do susto mais inexplicável que jamais sentirei novamente.

Que o bom Deus um dia me conceda, mesmo que no sonho, o presente mais especial de Natal, que nunca pedi, a graça de me assustar na noite silenciosa com o bumbo, a gaita, a viola e as rabecas, e os homens, os magos recém chegados do Egito com seu entoar lamentado. Com seu Ai.

E papai do céu fica me devendo também a madrugada memorável, resgatando tantas madrugadas infelizes que tive ainda criança, ele fica me devendo a alegria, mais do que alegria, o alumbramento, de abrir as portas da minha casa, mesmo que seja numa outra existência, para o Santo Reis entrar.

(CONTINUA)
Primeiro domingo do advento

Segundo domingo do advento