Já que girei o botão do túnel do tempo com tanta força a ponto de chegar aos anos sessenta, e já que estou lá, vou tascar só mais uma historinha daquela época. Depois prometo que retorno. Espero. Isso de voltar ao passado é perigoso, mexe com a gente, destampar o panelão das lembranças nem sempre é bom, principalmente no meu caso – não tive uma infância feliz, pelo contrário, venho de um lar desgraçado, já devo ter falado isso aqui. Por isso se vocês virem que não estou retornado, dêem uma cutucada, passem e.mail, telefonem, apareçam... Como? vocês não têm o meu endereço? Pois eu garanto que um de vocês que lê aqui, e apenas um, possui o meu endereço. Para descobrir quem é esse um vocês terão de se falar. Mas acalmem-se, não será preciso, eu volto.
Meu lar como disse era desgraçado, mas minha mãe se esforçava por torná-lo menos pior, ela fazia o que estava ao seu alcance. E a historinha de hoje é justamente sobre mais um dos passeios a que ela nos levou, e esse foi a ver as comemorações da vitória do Brasil na Copa de 62. Agora mergulhei fundo, eu sei.
Naqueles tempos, a avenida Paulista não era esse protestódromo e comemoródromo que é hoje. Tudo se concentrava na Avenida São João. Eu morria de medo da Avenida São João, por conta de uma música do Adoniran Barbosa, de uma tal Iracema, que morreu atravessando a tal avenida. Por conta da música, eu achava que bastava pisar o pé na Avenida São João que já se morria, automaticamente. Isso pra vocês verem que minha fé no azar é antiga.
Mas a avenida estava linda, e eu esqueci meus medos. Rapazes e moças passavam buzinando e fazendo festa em magníficos carros abertos, carros que eu jamais tinha visto antes. Homens se atiravam sobre os capôs dos carros em movimento, e tudo era permitido, e tudo era alegria. Fogos de artifício explodiam e por toda a parte se ouvia: O Brasil ganhou,Viva! o Brasil ganhou! Já devo ter contado aqui pra vocês como eu era bobinha e desinformada. O Brasil ganhou o quê?!? Será que o Brasil ganhou a guerra?! Então vocês entenderam não é, eu tinha o conceito “guerra” em minha cabeça, mas não tinha o conceito “copa do mundo”. Só para vocês sentirem o lar do qual eu vinha...
Se eu tivesse perguntado para minha mãe talvez ela tivesse explicado, o caso é que eu era tremendamente calada, os pontos de interrogação ficavam todos em minha cabeça. Então ficou assim, eu assistia às comemorações, mas não entendia exatamente o que estava acontecendo.
Mas estava tudo uma maravilha. Do alto dos imensos prédios – eram imensos naquela época – caiam chuvas de confetes coloridos. Os homens atiravam serpentinas, formando um magnífico entremeado de fitas coloridas por toda a parte. As moças passavam de carro e borrifavam na gente um delicioso perfume, fiquei querendo que minha mãe comprasse um daqueles lança perfumes para mim. Mas ela disse que não era coisa de crianças. Mas comprou uma serpentina para cada um, que nós não jogamos, mas guardamos para trazer para casa, a minha ficou guardada em minha bolsinha de ir à igreja.
Ela também nos comprou bandeirinhas, eu ganhei duas, uma de São Paulo e uma do Brasil. Naqueles tempos as bandeirinhas eram de papel, e eram lindas.
Também ganhamos um saquinho de pipocas cada um, e uma garrafinha de Guaraná Champanhe Antártica, para ser dividida por nós dois. E voltamos felizes para casa, eu muito orgulhosa de minhas duas bandeirinhas.
Que quando chegamos, minha mãe colocou para mim numa garrafa de Tubaína, e pôs em cima do armário da cozinha, que naquele tempo chamávamos guarda-comida.
Meu lar como disse era desgraçado, mas minha mãe se esforçava por torná-lo menos pior, ela fazia o que estava ao seu alcance. E a historinha de hoje é justamente sobre mais um dos passeios a que ela nos levou, e esse foi a ver as comemorações da vitória do Brasil na Copa de 62. Agora mergulhei fundo, eu sei.
Naqueles tempos, a avenida Paulista não era esse protestódromo e comemoródromo que é hoje. Tudo se concentrava na Avenida São João. Eu morria de medo da Avenida São João, por conta de uma música do Adoniran Barbosa, de uma tal Iracema, que morreu atravessando a tal avenida. Por conta da música, eu achava que bastava pisar o pé na Avenida São João que já se morria, automaticamente. Isso pra vocês verem que minha fé no azar é antiga.
Mas a avenida estava linda, e eu esqueci meus medos. Rapazes e moças passavam buzinando e fazendo festa em magníficos carros abertos, carros que eu jamais tinha visto antes. Homens se atiravam sobre os capôs dos carros em movimento, e tudo era permitido, e tudo era alegria. Fogos de artifício explodiam e por toda a parte se ouvia: O Brasil ganhou,Viva! o Brasil ganhou! Já devo ter contado aqui pra vocês como eu era bobinha e desinformada. O Brasil ganhou o quê?!? Será que o Brasil ganhou a guerra?! Então vocês entenderam não é, eu tinha o conceito “guerra” em minha cabeça, mas não tinha o conceito “copa do mundo”. Só para vocês sentirem o lar do qual eu vinha...
Se eu tivesse perguntado para minha mãe talvez ela tivesse explicado, o caso é que eu era tremendamente calada, os pontos de interrogação ficavam todos em minha cabeça. Então ficou assim, eu assistia às comemorações, mas não entendia exatamente o que estava acontecendo.
Mas estava tudo uma maravilha. Do alto dos imensos prédios – eram imensos naquela época – caiam chuvas de confetes coloridos. Os homens atiravam serpentinas, formando um magnífico entremeado de fitas coloridas por toda a parte. As moças passavam de carro e borrifavam na gente um delicioso perfume, fiquei querendo que minha mãe comprasse um daqueles lança perfumes para mim. Mas ela disse que não era coisa de crianças. Mas comprou uma serpentina para cada um, que nós não jogamos, mas guardamos para trazer para casa, a minha ficou guardada em minha bolsinha de ir à igreja.
Ela também nos comprou bandeirinhas, eu ganhei duas, uma de São Paulo e uma do Brasil. Naqueles tempos as bandeirinhas eram de papel, e eram lindas.
Também ganhamos um saquinho de pipocas cada um, e uma garrafinha de Guaraná Champanhe Antártica, para ser dividida por nós dois. E voltamos felizes para casa, eu muito orgulhosa de minhas duas bandeirinhas.
Que quando chegamos, minha mãe colocou para mim numa garrafa de Tubaína, e pôs em cima do armário da cozinha, que naquele tempo chamávamos guarda-comida.